segunda-feira, 17 de agosto de 2009

OU SE FAZ A REFORMA POLÍTICA OU O PODER EXECUTIVO CONTINUARÁ PRISIONEIRO DO PODER ECONÔMICO E DAS OLIGARQUIAS


Atravessamos mais um momento de profunda de crise e decepção com o sistema político. Decepção da população como um todo e daqueles que lutaram contra o arbítrio, indignados com o fato de ver o presidente, governadores e prefeitos progressistas, em nome da chamada governabilidade se aliarem com pessoas que eram inimigos de ontem, aos quais denunciavam por imoralidades e outras coisas mais. E ainda para piorar não conseguem efetivar políticas fundamentais que prometeram para se eleger. Em razão disso, mostro a causa principal deste fato acontecer. Isto é a realização de um projeto dos estrategistas do poder econômico, em especial, o financeiro. Ora vejam porque.
O governo federal acaba de encaminhar uma proposta de reforma política ao Congresso Nacional propondo lista fechada, financiamento público exclusivo, fidelidade partidária, inelegibilidade, fim das coligações proporcionais e cláusula de barreira. Tal proposta partiu do diagnóstico do atual sistema que rege o processo político brasileiro, é “balizado por um presidencialismo de coalizão incrustado em um quadro partidário multifragmentado e volátil, que condiciona os governos à montagem de composições partidárias amplas, com vistas à garantia mínima de governabilidade”. E que num quadro desses, os sucessivos mandatários, eleitos pela via democrática, tiveram dificuldades para governar, pois a montagem do governo e de sua sustentação no parlamento nunca se deu em bases programáticas. Pelo contrário. As coligações são apenas para atender às demandas paroquiais, há exacerbação de personalismo, prevalência do poder econômico e fragilização dos partidos, inviabilizando um projeto nacional. Com reflexos nos demais poderes e nas esferas estadual e municipal.
Afinal, o sistema mantido pela nossa Constituição Federal foi o estruturado pelo poder econômico, que vendo o seu modelo de desenvolvimento elitista e para poucos ruir com desemprego, carestia e miséria. Trouxe o avanço das oposições nos Estados mais populosos, com a inevitável perda da presidência, os governos e prefeituras, resolveram montar um sistema parlamentar para continuar dando as cartas. Principalmente porque este sistema político tem como base excesso de partidos, fracos e elege inevitavelmente pessoas muito, muitíssimas desqualificadas. O que é bom para o poder econômico e para as oligarquias regionais continuar mandando nos governos.
Diagnóstico correto colocado na mensagem da proposta de reforma política, porém, não se fala num dos temas mais importantes para a reforma política, que é a distorção do sistema representativo pela falta da adoção do coeficiente eleitoral nacional, para a eleição dos deputados federais e a necessidade de tirar o papel do Senado Federal de segunda Câmara revisora, que agride o Estado de direito democrático.
No caso da Câmara dos Deputados, casa de representação do povo, determinou que poderão eleger-se um mínimo de oito e um máximo de setenta deputados federais por Estado-membro. Não adotando a forma de coeficiente eleitoral nacional o que acabou produzindo uma distorção, pois aproximadamente 40% dos eleitores elegem 263 deputados federais e 60% dos eleitores elegem apenas 250 deputados federais.
O Senado Federal - casa de representação dos Estados-membros - que foi ampliado com a transformação de territórios pouco populosos e com pequenas economias, que deveria ter como atribuição discutir matérias de interesse da União e de conflitos entre as unidades federativas, mantendo o equilíbrio para o desenvolvimento das regiões. Mas, por distorção do sistema representativo, os senadores têm um dos campos de atribuições e competências dos mais amplos do mundo, podendo votar e vetar tudo, como se fosse uma segunda Câmara revisora.
A forma de impor um mínimo de três senadores por Estado-membro, gera uma distorção em que, aproximadamente, 40% dos eleitores elegem 59 senadores e 60% dos eleitores elegem apenas 22. Simbolizado na figura do senador eleito com 10 milhões de votos, tendo o mesmo peso de um senador que se elegeu com 300 mil votos. Isso é tão grave, pois o campo de atribuição e competência tão amplo acaba barrando a modernização das legislações brasileiras, pois representantes de Estados-membros poucos populosos e com economia pequena acabam impondo projetos locais, às vezes pessoais, em detrimento aos interesses estratégicos da sociedade brasileira.
Diante desse dilema, a reforma política - que seria realmente necessária - vai sendo protelada e o eleitor brasileiro em alguns Estados-membros vale 0,5 voto, enquanto em outros vale 15,4 votos. Não é por acaso o desinteresse pelas eleições, pois a distorção do sistema representativo distancia o representante do representado, comprometendo o sistema democrático. Distanciamento que não será resolvido só com a reforma proposta.
Em função dessa distorção, qualquer Presidente da República, Governador e Prefeito eleito pelo voto direto, por mais progressista que seja, teve, tem e terá problema de governabilidade. É só ver o caso recente do presidente Lula, eleito com 40 milhões de votos no primeiro turno. Caso tivéssemos o coeficiente eleitoral nacional, ele teria elegido uma bancada de apoio muito maior. Mas, a distorção do sistema representativo fez eleger bem menos, gerando problemas de governabilidade. Resultando naquilo que o poder econômico que um presidencialismo de coalização, ou seja, você pensa que esta votando num presidente, governador e prefeito com um programa de governo progressista, mas nas eleições do parlamento, em razão da deformação do sistema político, a sociedade não percebe que elege um governo de coalização, as vezes conservador, desqualificado e retrógrado. E por isso, é difícil governar e implantar políticas públicas voltadas para o povo por culpa desta engenharia política imposta pelo poder econômico e as oligarquias regionais, que resistem em mudar. Pois ganharam e ganham muito com ela.
Há de se considerar também que a distorção do sistema representativo, estruturado pelo poder econômico, para evitar o avanço das oposições progressistas, acabou gerando um custo muito alto para o país manter a governabilidade, pois para garantir a maioria no parlamento foi usado como moeda de troca à criação e a manutenção de inúmeras estruturas públicas desnecessárias no âmbito federal, estadual e municipal. Incluindo as indicações para o poder judiciário e nos tribunais de contas, colocando em dúvida o princípio da independência dos poderes. Além do mais, acabamos por ter um sistema representativo deformado que ajudou muito na construção de uma divida interna e externa e um sistema previdenciário que beneficia a poucos, agregado o fator previdenciário, que vai dilapidando os benefícios com o tempo. E, também, a manutenção do controle dos meios de comunicação, de um sistema agrário, urbano, tributário questionável e uma política de juros e cambial que onera o setor produtivo nacional e a sociedade; Impedindo a nossa industrialização, impondo um projeto de exportadores de commodites (matéria prima sem industrialização e agregação de valor, como açúcar, farelo, madeira, minério, carne in natura etc), e por conseqüência a dura realidade na divisão internacional do trabalho, de geradores de empregos com baixos salários.
Por isso, a sociedade brasileira deve debater a reforma política sob a ótica de um novo pacto federativo, para que se redefina as atribuições dos senadores, o critério de composição do Senado Federal e inclua a mudança na eleição da Câmara dos Deputados. Não só sob o enfoque da reforma do sistema partidário e eleitoral. Devendo-se exigir a implantação do coeficiente eleitoral nacional, de acordo com o fundamento do princípio "um cidadão, um voto". Esse princípio desaguará na regulamentação de mecanismos de participação popular e na reforma do Estado com o objetivo de se construir, verdadeiramente, um Estado de direito democrático e, por decorrência, um novo modelo de desenvolvimento democrático para todos os brasileiros.

Por Geraldo Serathiuk, advogado especializado em direito tributário pelo IBEJ/PR e com MBA de Marketing e Estratégia da UFPR.

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