Deputado reagiu à cassação imposta pelo STF
O GLOBO
A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de que
os três parlamentares condenados no julgamento do mensalão perdem os
direitos políticos e, consequentemente, seus mandatos — após todos os
recursos, abriu um racha entre o STF e a Câmara dos Deputados.
O
presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), insistiu nesta segunda-feira
que a última palavra sobre cassação é dos parlamentares, e não dos
ministros do tribunal. Maia, no entanto, baixou o tom em relação a
declarações anteriores. Não falou em desrespeitar a decisão do STF, mas
em recorrer à Justiça assim que for publicado o acórdão do STF sobre o
deputados condenados.
Ao fim do julgamento, o procurador-geral
da República, Roberto Gurgel, anunciou que pedirá a prisão dos réus. A
medida atingiria 22 dos 25 condenados, já que três cumprirão pena
alternativa. O pedido deve ser feito durante o recesso do STF, que
começa dia 20 de dezembro e vai até 1º de fevereiro. Durante metade
desse período, o presidente do tribunal e relator do processo, Joaquim
Barbosa, poderá decidir sozinho pedidos desse tipo, sem precisar levá-lo
à analise dos colegas em plenário.
A praxe é que o presidente
divida o período de plantão com o vice, Ricardo Lewandowski, que também é
o revisor do processo. Nesta segunda-feira, Joaquim informou que ainda
não discutiu com o colega como será a gestão do STF durante o recesso.
—
Se ele (Gurgel) apresentar antes de quarta-feira, eu posso trazer para o
Pleno. Se apresentar depois, ou eu precisar de mais tempo para
analisar, eu decidirei no recesso — anunciou Joaquim.
O STF
decidiu que não será necessário abrir processo na Câmara dos Deputados
para confirmar a perda de mandato dos parlamentares João Paulo Cunha
(PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP)e Pedro Henry (PP-MT), como defendeu
a minoria dos integrantes do tribunal. Em seu voto, que desempatou a
votação, o ministro Celso de Mello chegou a advertir que seria
inadmissível a Câmara descumprir a decisão do STF, o que caracterizaria o
crime de prevaricação, previsto no Código Penal.
Marco Maia
evitou polemizar com Celso de Mello. Reafirmou, no entanto, que cabe à
Câmara cassar mandatos de deputados que sofram condenações criminais, e
adiantou que a Casa irá recorrer. Para o presidente da Câmara, a decisão
do STF é precária e não é definitiva.
— Não há recuo nenhum. A
decisão tomada pelo tribunal não encerra o assunto. É uma decisão
precária, de 5 votos a 4. Temos mais dois ministros que devem ocupar
seus mandatos. A decisão contraria a Constituição e tira prerrogativa da
Câmara. Como a medida tomada não foi imediata, só vale depois, há um
período de recursos e debates sobre o tema. Podem mudar opiniões e
posicionamentos no Supremo. Vamos utilizar todos os mecanismos para
convencer que não é razoável ingerência na prerrogativa da Câmara —
disse Marco Maia.
Ele, no entanto, evitou responder a Celso de Mello, principalmente sobre a prevaricação:
—
Acho que ele falou em clima de emoção que está vivendo, pela sua doença
e pelo julgamento tão tenso que está realizando. Não acho que nenhum
ministro do STF teria a pretensão de ameaçar o presidente da Câmara dos
Deputados. Há alguns anos, o ministro fez um discurso contundente
dizendo que é prerrogativa da Câmara cassar os mandatos. Mudou sua
posição. Se isso se confirmar, a Câmara não vai mais tratar de cassação.
O
presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou que divergências
entre Poderes não ajudam o país e disse esperar que, até a publicação do
acórdão do STF determinando a cassação dos mandatos dos deputados, haja
uma solução que evite a “desarmonia” entre a Câmara e o Judiciário.
O
voto do ministro Celso de Mello desempatou a discussão da perda de
mandato. Até então, quatro ministros, incluindo o relator, entendiam que
a última palavra cabe ao STF. Outros quatro, entre eles Lewandowski,
votaram no sentido de que a decisão é da Câmara. Celso de Mello se
juntou ao primeiro grupo.
Ele citou o voto do ministro Gilmar
Mendes, que havia feito uma distinção entre dois tipos de crime. Numa
categoria, ele colocou os crimes contra a administração pública e
aqueles que resultam em condenação superior a quatro anos. Nesses casos,
a perda do mandato parlamentar é decretada pelo Judiciário. Nas demais
hipóteses, cabe à Câmara para dar a decisão final. Para justificar seu
raciocínio, Celso combinou artigos da Constituição e do Código Penal.
—
Nessas duas hipóteses, a perda do mandato é uma consequência direta e
imediata da suspensão de direitos políticos causada pela decisão
transitada em julgado. Neste caso, a Casa legislativa à qual pertence o
congressista procederá meramente declarando esse fato. Nos demais casos,
subsiste a deliberação da Casa legislativa. A Casa legislativa poderá
então, por votação secreta e com maioria absoluta, cassar aquele mandato
ou simplesmente, não alcançada a maioria absoluta, tornar intacto esse
mesmo mandato parlamentar — argumentou.
O ministro Marco Aurélio Mello, que havia votado da mesma forma, concordou com Celso:
—
A consequência (perda do mandato) é a consequência querida pela Carta
da República. E limita-se à Mesa, e não à Casa legislativa (plenário),
declarar a perda. É uma providência meramente declaratória e não
constitutiva.
Após a conclusão do julgamento, as primeiras palavras de Joaquim foram:
— Concluímos. Finalmente.
E completou:
—
Nunca mais vão ouvir falar de uma ação tão longa, de um julgamento tão
complexo. A lição (do julgamento) é de que o Supremo não deve chamar
para si processo dessa dimensão, porque o tribunal está parado há quatro
meses.
Sobre o pedido de prisão dos condenados, normalmente o
STF determina após o trânsito em julgado — ou seja, quando o réu não
tiver mais possibilidade de recorrer da decisão. Questionado se o STF já
tinha determinado a prisão antes do fim do processo, Joaquim respondeu:
—
Desde que estou aqui, não tenho essa informação não. Mas há sim
(precedentes) em turmas. Em turmas, é bastante comum em julgamento de
habeas corpus, de recurso mais comum, recurso extraordinário.
Roberto Gurgel explicou a razão de não ter apresentado nesta segunda-feira o pedido de prisão:
—
Eu na verdade gostaria de aguardar a conclusão do julgamento. Tão logo
concluído o julgamento, eu faria por intermédio de uma petição que
disporia de uma forma mais adequada essa pretensão do Ministério
Público. Gostaria de fazê-lo apenas após a conclusão do julgamento.
Nesta
segunda-feira, o Supremo também discutiu a redefinição de multas. A
multa do advogado Rogério Tolentino foi de R$ 312 mil para R$ 494 mil.
Tolentino foi condenado a seis anos e dois meses pelos crimes de
corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
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